quinta-feira, 23 de abril de 2009

Neurociência & a Lei,



Neurociência & a Lei,

18-Out-2007

Introdução

 
A Neurociência está progressivamente identificando associações entre a Biologia & Violência, o que parecem oferecer
evidências relevantes para a responsabilidade criminal. Podem os correlatos biológicos da violência serem identificados
e a “ causa “ ser estabelecida? tais correlatos permitem inferir-se ausência ou reduzida culpabilidade
moral ou legal?

 
Se o neurocientista puder provar que o cérebro determina a mente, então os advogados poderão convencer os jurados
que os réus não podem ser totalmente responsáveis por seus crimes (Gazzaniga & Steven, 2005). De fato a tomada de
decisões surge da atividade eletroquímica das redes neuronais das várias áreas do cérebro.A experiência de decidir
é conseqüência da atividade fisiológica do cérebro.

 
O cérebro humano foi moldado geneticamente ao longo da história evolutiva de nossa espécie (Homo sapiens sapiens)
e desenhado para pensar de certa maneira (O´Hara, 2004);

 


 


 


 

Há alguma relação entre ciência & a lei?

 
A lei é em última instância pragmática, persegue a idéia abstrata de
 
justiça pela adoção de artifícios legais.Por outro lado, a ciência
 
tenta descrever ou em última instância, explicar os fenômenos reais.Os
 
neurocientistas estão interessados como se gera o “pensamento” a
 
“emoção”, ao passo que a lei está interessada na “intenção” e a “culpa”
 
do indivíduo. A própria unidade da realização do direito está baseada
 
no modo da explicação dominante sobre a racionalidade ou emoções
 
ideais, que os operadores jurídicos têm do processo de tomada de
 
decisão (Fernandez, 2005).

 
O progresso em neurociências & tecnologia levanta inúmeros pontos
 
com respeito aos construtos fundamentais da lei como competência de
 
submeter o réu ao júri (Goodenough & Zeki, 2004). Objeções por
 
exemplo com relação à gênese do comportamento violento, o conhecimento
 
de que deficiência nos circuitos cerebrais predispõe certas pessoas a
 
serem violentas. A sociedade precisa alterar como pune e reabilita
 
estas pessoas julgadas como culpadas, o que demanda o estudo novas
 
determinações legais. Todavia, deve-se ter em conta que, embora o que
 
origina um ato criminal ou outro possa ser explicado em termos de
 
função cerebral, não significa que a pessoa que perpetua o ato seja
 
escusada de responsabilidade. Um primeiro passo indica que o cérebro
 
exerce sua função de comunicação inter-neural antes que a pessoa fique
 
ciente de um pensamento, já observado por pesquisadores da Universidade
 
da Califórnia particularmente por Benjamin Libet, na década de ´80.
 
Tudo indica que nosso cérebro faz as coisas antes que estejamos cientes
 
e conscientes disto. Há algum conhecimento científico que argumente a
 
favor de que o comportamento violento possa gozar de culpabilidade
 
reduzida perante a Lei?

 


 
Neurociência & comportamento anti-social.

 
Numerosos estudos identificaram associações entre estrutura e função do
 
cérebro, com índices de comportamento anti-social. Estudos estruturais
 
com neuro-imageamento, por exemplo ressonância magnética funcional, que
 
carecem ainda de repetição. Investigação com indivíduos anti-sociais
 
relatou-se:

 

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a-aumento do corpo caloso (Raine et al., 2003)

 
b- córtex pré-frontal reduzido (Raine et al., 2000)

 
b-volume reduzido no hipocampo posterior (Laakso et al., 2001)

 
Estudos funcionais com neuro-imagemento nestes indivíduos relatou-se:

 
a- associação entre metabolismo no córtex frontal e história de comportamento violento repetitivo (Volkow et al., 1994);

 
a- distúrbio de personalidade e histórico de agressão (Goyer, 1994).

 
Evidência experimental indica que pacientes com lesões cerebrais,
 
confirma que a camada do córtex pré-frontal tem papel crítico no
 
comportamento social.

 
Por outro lado, exames psicológicos indicam que pessoas cometem crimes
 
violentos freqüentemente apresentam distúrbios de personalidade
 
anti-social.

 
Foi feito neuro-imageamento (PET) com 21 pessoas diagnosticadas com
 
distúrbio de personalidade (DPAS) anti-social e comparado com sujeitos
 
saudáveis.

 
Os com DPAS mostraram volume reduzido de massa cerebral e diminuição de
 
atividade neural na área pré-frontal se comparado com os controles.
 
Contudo,

 
caberia salientar que o neuro-imageamento é um registro indireto da
 
atividade metabólica do neurônio ( consumo de oxigênio & glicose),
 
e não registro direto de potenciais de ação e potenciais sinápticos
 
de grupos de neurônios.Este achado indica que há diferença estrutural
 
entre os cérebros de criminosos com DPAS e população normal, o que
 
sugere que há diferença funcional na atividade do cérebro com relação
 
ao comportamento social.Outros indivíduos diagnosticados com DPAS e
 
“agressão impulsiva” examinados por PET e substância excitatória
 
(M-CPP), normalmente ativa-se o cíngulo anterior (área frontal do
 
cérebro envolvido na inibição) e inativa-se o cíngulo posterior, já
 
observado pela pesquisadora Antonia S. New, da Escola de Medicina Mount
 
Sinai, USA). Já com aqueles afetados por “agressão impulsiva”, ocorria
 
o oposto; o cíngulo anterior era desativado e o cíngulo posterior
 
ativado. Conclusão: pessoas com agressão impulsiva têm menos ativação
 
da região inibitória, o que pode contribuir na modulação da agressão,
 
não coibindo o ato violento.

 
Alterando a Lei.

 
A fim de que fulano vá para a prisão por crime ou delito, o sistema
 
legal quer que se prove que o ato proscrito e a mente culpada estejam
 
bem definidas. A lei quer saber que a neurociência afirma, se fulano
 
pode ou não ser pessoalmente responsável pelo ato ilícito.Contudo,
 
responsabilidade é um construto humano. Na prática as autoridades
 
legais se debatem em estabelecer os padrões da linha divisória entre
 
responsável & não responsável. O ponto de vista legal do
 
comportamento humano é que a pessoa age porque livremente deseja agir.
 
É o livre arbítrio?

 
Já o ponto de vista da Neurociência é que o comportamento humano é
 
gerado pelas ações mecânicas (físico-químicas) do sistema nervoso. O
 
cérebro é um sistema biológico que se submeteu as regras da evolução,
 
um artefato de tomada de decisão, que interage com seu ambiente de modo
 
a aprender as regras de como responder automaticamente. Todavia
 
“responsabilidade” é um construto social que existe nas regras da
 
sociedade, não existe nos circuitos neuronais! Assim, a neurociência
 
seguindo a linha de investigação cognitiva da moral, poderá vir a
 

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fornecer rica contribuição quanto ao funcionamento do cérebro humano no
 
ato de julgar; formular juízos morais acerca do justo e do injusto
 
(Goodenough & Prehn, 2004)

 
Em conclusão, os cérebros são artefatos biológicos automáticos,
 
governados por regras fixas, muitas ainda por descobrir, ao passo que
 
as pessoas são agentes livres e responsáveis para tomar decisões.
 
Cérebros são determinados, pessoas são livres.

 
Para saber mais:

 
Fernandez, A. (2005). Direito e neurociência. Neurociências, 2(5):250-254.

 
Gazzaniga, M. S., Steven, M. S. (2005). Neuroscience and the law. Scientific American Mind (April), 1(3):16-21.

 
Goyer, P. F. et al., (1994). Positron-emission tomography and personality disorders.Neuropsychopharmacology, 10:21


28.

 
Goodenough, O. R., Prehn, K. (2004). A neuroscientific approach to
 
normative judgment in law and justice. Phil. Trans. R. Soc., Lond. B.,
 
359:1709-1726.

 
Goodenough, O. R., Zeki, S. (2004). Law and the brain. Phil. Trans. R. Soc. Lond. B., 359:1661-1665.

 
O´Hara , E. A. (2004). How neuroscience might advance the law. Phil. Trans. R. Soc. Lond. B., 359:1677-1684.

 
Laakso, M. P. et al., (2001). Psychopathy and the posterior hippocampus. Brain Res., 118:187-193.

 
Raine, A. (2000). Reduced prefrontal grey matter volume and reduced
 
autonomic activity in antisocial personality disorder. Arch. Gen.
 
Psychiatry, 57:119-127.

 
Volkov, N. D. et. al, (1995). Brain glucose metabolism in violent psychiatric patients. Psychiatry Research, 61:243-253.

 

 
NOTA SOBRE O AUTOR:

 


 
Professor Adjunto de Fisiologia, Lab. de Neurociência & Educação, UFPR;

 
Consultor Acadêmico & Científico, Fellow in Basic Medical Education, University of Washington, US.

 

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